ECOLOGIA INTEGRAL x DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL
Na
manhã de domingo passado, logo depois da celebração eucarística, fui abordado
por um paroquiano nosso, freqüentador assíduo de missa aos fins de semana além
de ex-dirigente dos ‘Cursilhos de Cristandade’ e propagandista da Mãe Rainha,
imagem itinerante com a capelinha estimulando a devoção mariana nas residências
familiares. Ele me perguntando, ou melhor, me questionando: “O que a igreja tem de se meter nessa
questão do saneamento básico?”; “Isso não é assunto de política?”;
“Algo para ser resolvido pela Prefeita e
pela Câmara Municipal, não tendo nada a ver com a nossa fé e nem com religião!”.
Opiniões
como essas assustam a gente pelo fato que desde 1964 se realiza durante a
quaresma em todas as dioceses e comunidades católicas a Campanha da
Fraternidade, cada ano ‘colocando o dedo
numa ferida do tecido social da sociedade brasileira’. Recordando alguns
exemplos: 1981 – Saúde para todos / 1983 – Fraternidade sim, violência não /
1986 – Terra de Deus, terra de irmãos / 1987 – Quem acolhe o menor, a Mim
acolhe / 1991 – Solidários na dignidade do trabalho / 1999 – Sem trabalho...
Por quê? / 2001 – Vida sim, drogas não! / 2011 – A criação geme em dores de
parto.
Talvez
seja devido ao fraco empenho dum número considerável de paróquias e à
deficiente motivação duma parte do clero, talvez também por causa dos
movimentos com grande adesão nas últimas três décadas como a Renovação
Carismática Católica, que a ‘espiritualização vertical’ dificulta o nosso povo
a identificar as tais feridas com as
próprias chagas de Jesus de Nazaré agonizante na hora da sua crucificação,
sendo vítima inocente duma intriga política articulada pela elite da época.
Entretanto,
são 52 anos que a igreja sob a orientação da CNBB procura valorizar o tempo
preparatório à grande festa da ressurreição, a Páscoa do Cristo, como um tempo favorável para, através de um trabalho de conscientização
com abrangência dum verdadeiro ‘mutirão nacional’ conduzir-nos em direção de
uma vida mais plena tanto na dimensão individual quanto na coletiva. A
ótica que prevalece está sob o signo da ‘TRANSFORMAÇÃO’,
em nome da ‘Nova Terra e do Novo Céu’ seguindo a proposta do Filho unigênito de
Deus no evangelho. Em outras palavras, sendo atingidos pelo mistério da dor e
da morte do Crucificado, somos convidados a procurar através de exercícios
quaresmais correspondendo ao apelo pela conversão, nos esvaziar do supérfluo e
do consumismo desenfreado a fim de nos comprometermos com a partilha solidária, nos aproximando mais da generosidade, da
gratuidade e da graça divinas.
O
lema este ano “Quero ver o direito brotar
como fonte e correr a justiça qual riacho que não seca” (Am 5, 24) e o tema
“Casa comum, nossa responsabilidade” focando
principalmente o saneamento básico, apontam para a ECOLOGIA INTEGRAL e não a
meramente ambiental. Estão em sintonia com a encíclica Laudate Si do papa
Francisco, que também propõe uma abordagem ecológica integral: todas as coisas e seres do mundo como
realidades inter-relacionadas, formando um grande todo. Não se pode falar de ecologia ambiental
adequadamente sem falar de ecologia humana, de economia, de justiça social, de
ética. Como lembra o papa: “o grito
da terra é também o grito dos pobres”. Com efeito, quando não se cuida do
meio ambiente, quem mais sofre as conseqüências são os mais vulneráveis. É o
que demonstra também a Campanha da Fraternidade, ao tratar da falta de
saneamento e de doenças daí provocadas.
A
rica expressão do profeta Amós escolhida para a chamada de atenção surgiu num contexto
de muita religiosidade e pouca justiça
social. O profeta adverte que cultos com esplêndidas liturgias, mas
desligados da justiça e até servindo para disfarçar e desculpar ou ocultar
injustiças, opressões e egoísmo, são rejeitados e detestados por Deus.
A
degradação da ‘casa comum’ é decorrente da ganância desmedida e da voracidade
produtivista, as quais não só retiram da natureza mais do que é necessário para
viver e do que ela pode dar, como também produzem lixo e poluição que a
destoem. A degradação humana, a
degradação ética e a degradação ecológica estão intimamente ligadas.
Para
apaziguar a consciência, investe-se num discurso ecológico, da
‘sustentabilidade’ ou do ‘DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL SUPERFICIAL E PALIATIVO,
que não muda em nada essa engrenagem econômica perversa!
Por
um lado, são realizadas ações pontuais e inócuas a favor da natureza, por
outro, ela é destruída, havendo até mesmo o uso do discurso da
‘sustentabilidade’ como forma de marketing,
para vender todo tipo de produtos supostamente ecológicos ou para melhorar a
imagem de empresas predatórias. Observa-se que muitas vezes basta que os
produtos sejam considerados ‘verdes’ para que as pessoas se sintam
desresponsabilizadas pelo consumismo e pelo descarte. Ao mesmo tempo, retira-se da idéia de ‘sustentabilidade’
tudo o que significa RENÚNCIA, restando uma superficialidade hedonista, indolor
e celebrativa. Esse tipo de postura e atitude é simular à forma de
religiosidade denunciada pelo profeta Amós.
IINFORME-SE
A Organização Mundial da Saúde define
saneamento como o controle de todos os fatores do meio físico do homem, que
exercem ou podem exercer efeito deletério sobre seu bem-estar físico, mental e
social. Portanto, é evidente que, pela sua própria definição, o saneamento é indissociável
do conceito de saúde.
Padre
Chico, terça 01 de março de 2016
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